O NARIZ COLETIVO
Nada mais deprimente do que esses retratos de família em que todos
têm o mesmo nariz (será postiço?) e onde todas aquelas caras parece que
estão pensando: “Mas como somos iguais, como somos animais!”
Não há de ser nada. Há um anonimato ainda mais sutil. E mais grave.
Quando folheamos revistas antigas, espanta-nos que todas aquelas pes-
soas que aparecem nas fotografias tivessem a mesma expressão. Vai ver
que todos pensavam igual! Era a cara da época. Era a cara de fora. Nin-
guém tinha a cara de dentro. “Também seremos assim?” — indagas agora,
na maior frustração. Pergunta supérflua. Devias inquirir: “Serei assim?”.
E trata, antes, de substituir a tua cara coletiva por uma fisionomia própria.
Depois conversaremos.
Há outras conotações, como hoje se diz. Por exemplo: nos Estados tota-
litários todas as pessoas têm a mesma cara. A grande manada. O rebanho
único. E se acaso aparece um bicho diferente, a solução é simples: caça-se.