CANÇÃO PARA OS QUE LUTAM NAS TREVAS
Meninos que combatem nas trevas,
enfrentando a fúria dos tiranos,
a força do poder blindado,
a Polícia Federal nas ruas,
o terror oficial nos esconsos
e a impunidade de hoje,
com uma bandeira rota
desfraldada pela vida,
canto-lhes esta canção,
que o sopro das noites
possa levar aos vencidos
a voz da solidariedade.
— Lutar,
lutar,
lutar!…
Mesmo que com as mãos atadas,
mesmo que os cartazes
espalhem seus rostos,
mesmo que a repressão
assassine seus sonhos,
mesmo que os carrascos
arranquem suas vidas,
mesmo que as mãos
que trazem a barbárie
lhes sufoquem nas trevas
é preciso lutar.
Pois, acima da ameaça,
acima dos métodos,
da injustiça,
do grito,
da dor,
está a Liberdade,
direito supremo do homem,
dizendo o que é preciso.
É preciso lutar
apesar do regime;
é preciso lutar
a despeito dos que morrem;
é preciso lutar
diante da intimidação;
é preciso lutar…
Que o sangue que lava as celas
seja recomposto nas veias;
que o plasma que alimenta os ratos
seja resgatado aos corações;
que os corpos debilitados
sejam recolhidos dos becos;
que os métodos do suplício
sejam extirpados dos homens;
que os condenados de hoje
nunca mais deixem marcas
e às praças onde tombaram os heróis
nunca mais voltem os assassinos.
Oh! Meninos que combatem
na Pátria esvaída em sangue,
enfrentando as balas
com o peito arfante,
que o vento da noite,
que entra pela janela,
fazendo-nos acreditar
que ainda estamos vivos,
leve para a clandestinidade
dos nossos vinte anos
esta canção inconfidente:
— Lutar,
lutar,
mil vezes lutar!…
Oh! Meninos que combatem
nas horas do infortúnio,
cantem a canção da esperança:
— Brava gente, brasileira!
— Brava gente, brasileira!
— Brava gente, brasileira!
Rio de Janeiro, 2.3.72