CANTO ESCURO
À companheira Gastone Beltrão, assassinada em
21 de janeiro de 1972
Não perdi teus olhos
como julgava...
Teu rosto de menina
que fugiu do arco-íris.
Não perdi a força de tuas mãos
elaborando manhãs.
A arma na gaveta
permanece muda,
esperando outras mãos
brotarem de tua ausência.
Este é um tempo sem flores.
E o canto, escuro, fere a boca.
Mas entre os filhos do povo,
alguém tece um canto humilde
e recolhe flores inéditas
para deixar sobre o teu túmulo,
que, por ora, ignoramos.
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Comentário do pesquisador
Pedro Tierra é pseudônimo de Hamilton Pereira da Silva. O poema "Canto escuro" integra a seção “Poemas da companheira”, parte do volume “Poemas do povo da noite”. Na segunda edição desse livro (coeditada pela Fundação Perseu Abramo e pela Publisher Brasil, em 2009), há um texto introdutório, intitulado “Explicação necessária”, em que Pedro Tierra (Hamilton Pereira da Silva) informa: “Os poemas aqui reunidos foram escritos durante os cinco anos de prisão – de 1972 a 1977 – e publicados em volumes separados: Poemas do povo da noite (Ed. Livramento, S. Paulo, 1979), Água de Rebelião (Ed. Vozes, Petrópolis, 1983)” (2009, p. 19). A edição de 2009, que reproduz “Canto escuro” na página 84, informa que esse poema foi escrito em 1975.