União nacional em três dias

Carlos Drummond de Andrade

UNIÃO NACIONAL EM TRÊS DIAS

 

 

 

 

Quem falou em guerra?

Chegam todos unidos:

Unidos de São Carlos

Unidos de Vaz Lobo

Unidos de Vila Isabel

Unidos de Nilópolis

do Cunha

de Manguinhos e de Padre Miguel

de Lucas, de Jardim

da Tijuca, da Ponte

do Morro do Pinto

Unidos do Tuiuti

da Vila São Luís

da Vila Santa Teresa

Unidos do Cabuçu Bangu Zumbi

Unidos (ecumenicamente) do Éden.

 

Restam, é certo, os Independentes do Leblon

(que antes eram Inocentes)

os de Mesquita

os Decididos de Quintino.

Uni-vos, caríssimos, e unidos todos

aos Acadêmicos do Salgueiro

do Engenho da Rainha

da Academia Brasileira de Letras

e de Santa Cruz

acolitados pelos Aprendizes da Gávea

pelos da Boca do Mato

pelos Índios do Leme,

de mãos dadas aos Cartolinhas de Caxias

aos Azulões da Torre

aos Caprichosos de Pilares

diremos aos irmãos do Império Serrano

do Império do Marangá

do Império de Campo Grande

aos de Lins Imperial

aos da Imperatriz Leopoldina:

Diletos,

chegou a hora da União Nacional.

Com todo o frevo, com todo o frevor

com todo o samba

que é uma tristeza aberta em alegria

à porta de Portela, à sombra de Mangueira

no pulo-bolo-pulo dos clubes

no tablado da Rua Miguel Lemos

de nosso mal viver faça-se um sonho

em Kodachrome

coruscante de strass e tão tamborinado

que na pele tensa percutida

a alma ressoa, o som é dor sem amargor.

 

De flor no cabelo

de flor na cara

de cara de pau

de pau de arara

de arara real

no Municipal

de umbigo de fora

de fora da terra

me dê, me dê a mão

vamos pro meio do salão

tom Dona Beja feiticeira do Araxá

e o Crioulo Doido decifrando

sublimes pergaminhos, oba oba.

 

Fuga? Integração?

Um sair de si mesmo em travesti

um encontrar-se, um dar-se, um desventrar-se

no grande aboio das manadas rítmicas

desfilando entre turistas de aço

até raiar o dia e a fantasia

desfolhar-se?

 

Unidos desunidos confundidos

diluídos

possuídos

do diabo dançarol e cantarinho

endemoninhados da Pavuna

festivos de Ipanema

repetentes do Fundão

abandonados de Deodoro

mutilados de Del Castilho

corruptos da Lapa Velha

humilhados de Ricardo de Albuquerque

párias do Nordeste em fogo e chuva

afogados do Amazonas párias

de toda parte vinde

vinde todos, vinde todos, vinde todos,

aqui e agora

re-unidos

num projeto de vida à flor da vida.

 

25/02/1968

 

 

Você também pode se interessar por

— Colofão

Coordenação

Marcelo Ferraz (UFG/CNPq)

Nelson Martinelli Filho (IFES/UFES/CNPq)

Wilberth Salgueiro (UFES/CNPq)

Bolsistas de apoio técnico (FAPES)

Juliana Celestino

Valéria Goldner Anchesqui

Bolsistas de pós-doutorado (CNPq)

Camila Hespanhol Peruchi

Rafael Fava Belúzio

Pesquisadores/as vinculados/as

Abílio Pacheco de Souza (UNIFESSPA)

Ana Clara Magalhães (UnB)

Cleidson Frisso Braz (Doutorando UFES)

Cristiano Augusto da Silva (UESC)

Diana Junkes (UFSCar)

Fabíola Padilha (UFES)

Francielle Villaça (Mestranda UFES)

Henrique Marques Samyn (UERJ)

Marcelo Paiva de Souza (UFPR/CNPq)

Mariane Tavares (Pós-doutoranda UFES)

Patrícia Marcondes de Barros (UEL)

Susana Souto Silva (UFAL)

Weverson Dadalto (IFES)

Além dos nomes acima muitas outras pessoas colaboraram com o projeto. Para uma lista mais completa de agradecimentos, confira a página Sobre o projeto.

O MPAC é um projeto de caráter científico, educativo e cultural, sem fins lucrativos. É vedada a reprodução parcial ou integral dos conteúdos da página para objetivos comerciais. Caso algum titular ou representante legal dos direitos autorais de obras aqui reproduzidas desejem, por qualquer razão e em qualquer momento, excluir algum poema da página, pedimos que entrem em contato com a nossa equipe. A demanda será solucionada o mais rapidamente possível.

— Financiamento e realização

© 2025 Todos os direitos reservados