UM FUSCA A 120
Rodagira quatro rodasgirando
g irando
gir ando
ando
g o
Fitas
fotos
cores
bandeiras de partir
de curtir
o tempo
no celerado espaço
das bocas do carburador
O salto no papel e no painel
cavalos a 90
110
130
140
Dentro da máscara o rosto
solta as rédeas
rodasgirando girando no comando
no descomando
no alto
no baixo
no plano
no declive
na faixa
no feixe (de nervos)
no holofote
na lama
na reta
na curva
(que na certa,
é incerta)
Vôos planos
em altiplanos
velocidade
sem rota nem cidade
equação: medo + emoção de girar
de chegar
de passar
de possuir
de refregar
Uma roda outra roda
multi-rodasgirando
rodogirando
gemendo
relinchando
freiando
partindo
malagindo
correndo
concorrendo
buscando
vivendo
morrendo
entregando-se
Pilotagem
pilantragem
sinal
todo legal
nas curvas
nos pontos
nos montes
nas setas
nas metas
na metamorfose
na ética
na tática
na técnica
na genética
no homem
no homo
no humus
no hormônio
no homônimo
Linhas
paralinhas
paralelos
faixas brancas
seguimentos amarelos
b a l i s a m e n t o s
no alto do salto
do monte ao mundo
da fonte ao fundo
no abalo sísmico
de chão rastreado
marcas rodasgirando
girando
g i r a n d o o o o o o
Faróis
clarões
nuvens
nevoeiros
noite
altanoite
escuridões
montanhas
montinhos
metafísica
velocidade em frente
na fronte
no avante
no passante
no pensante
Freeeeeeeeeio
nos bois
dos campos de arroz
escolas
escalas
molas
malas
verde-
amarelos
semáforos
vermelhos
no espelho
Flores
corando
dançando
no caminho
do animal mecânico
do homem-dor
dos botões
computador
nas rodas
nos saltos
nas buscas
dos fuscas
nos passos
nos aços
nas rachas
das taças
na rechaça
na cachaça
no pio
no rodopio
no salto
para o alto
para o forte
para o (a) n(m)orte
para o sul
para o azul
daqui e dali
na busca de ti.
Comentário do pesquisador
No livro "EXERCÍCIO DA PALAVRA", de 1975, merece destaque o poema "Um fusca a 120", no que diz respeito ao diálogo com os Anos de Chumbo. Alguns trechos do poema evidenciam a relação entre os versos e a situação política do país, como se vê na seleção vocabular que utiliza termos como "bandeira", "comando" e "descomando", mais no começo do poema. Há relação também entre "pilotagem" e "pilantragem", um pouco mais adiante. No entanto, é a estrofe que se inicia com "Freeeeeeeeeio" a mais forte, visto que nela o desenvolvimento das escolas e do campo ("bois" e "campos de arroz") está refreado no momento que o semáforo está "verde-/amarelo" (cores que expressam, no contexto da época, o nacionalismo ufanista muito ligado aos ditadores) e os "vermelhos" (cor que remete à visão política de esquerda) estão mais atrás, vistos no espelho.