TECENDO O CANTO
"...Hemos sembrado la tierra con muertos
que sin duda florecerán..."
Alberto Szpunberg
Recolho no ar teu verso claro
à maneira dos cantadores
do meu país.
Hoje, silenciosa, a terra trabalha
seus mortos como quem nutre
sementes de luz.
Possa algum perseguido,
encerrado nos calabouços
da América
alcançar meu verso humilde
e comporemos o vasto coro
dos oprimidos.
Não importa que hoje nos tremam os lábios
e a voz caminhe incerta
pela garganta,
se amanhã o canto
romperá na boca
de milhões.
Recolho entre as mãos teu verso
como o fuzil do companheiro
tombado.
Não importa que o corpo
de cada morto plantado
tarde a florescer.
(23/24, out. 74)
Comentário do pesquisador
Pedro Tierra é pseudônimo de Hamilton Pereira da Silva. O poema "Tecendo o canto" integra a seção “Poemas do Calabouço”. A segunda edição de "Poemas do povo da noite" (coeditada pela Fundação Perseu Abramo e pela Publisher Brasil, em 2009) apresenta um texto introdutório intitulado “Explicação necessária”. Nessa introdução, Pedro Tierra (Hamilton Pereira da Silva) informa: “Os poemas aqui reunidos foram escritos durante os cinco anos de prisão – de 1972 a 1977 – e publicados em volumes separados: Poemas do povo da noite (Ed. Livramento, S. Paulo, 1979), Água de Rebelião (Ed. Vozes, Petrópolis, 1983)” (2009, p. 19). A edição de 2009, que reproduz “Tecendo o canto” na página 34, informa que esse poema foi escrito em 23/24 de outubro de 1974.