SUAVE
(Suave é crer) a vida se prolonga
para além do mais alto sonho: infinda.
Planta que, morta, frutifica ainda
e sempre. E o que mais custa é esta delonga.
Na véspera do céu, o céu nos pesa
(suave é crer) como uma suculenta
fruta que vai cair, mas que relenta
da queda o gesto claro. E se despreza,
na espera, a dor de construir na Terra
um céu que não veremos — para alheios
olhos e bôcas, corações e seios.
Pois havemos de herdar (se a fé não erra),
pósteros de nós mesmos, o futuro
que vai regando o nosso sangue impuro.