SILÊNCIO DOIS, O DA CIDADE
Gato aloucado, o silêncio passeia
a sua noturna idade a procurar
nos hospitais, nas prisões e nos quartéis
um sofrimento sem saída, ou uma solidão
sem janelas, murcha como ventre
de uma esperança velha de mil séculos.
No medo da cidade a irradiar-se
em fios e ruídos enforcando a noite,
gato aloucado, o silêncio passeia
entre as manhãs adiadas como o grito
do que deveria ser o protesto da vida.
Gato aloucado, o silêncio estripa
a dor do homem entre suas unhas
polidas como a fala dos juízes
nos tribunais em que a sentença
arrazoa e consagra as violências.
Gato aloucado, o silêncio cada vez mais eriçado
mia, roufenhamente mia, mia sem parar
como se fosse o dilaceramento sem fim
dentro de todas as caixas registradoras.