Procuro o homem do povo
18/4/68
Procuro o homem do povo
o proletário
o camponês
o assalariado
Procuro o homem do povo
explorado
famélico
desabrigado
o que dorme na mansidão
do não saber.
Procuro o homem do povo
para ultrapassar a frieza
do vocabulário político,
e ver na "massa oprimida"
nas "contradições sociais"
na "luta de classes"
nas "análises de realidade"
o homem do povo.
Renuncio à Revolução calculada
milimétrica e friamente
no racionalismo tecnicista
dos "cientistas"
da transformação social.
Hoje
procuro o homem do povo.
Quero além da ignorância
além da fome
além do frio
O homem que se consome
nessa dor.
Quero as mesmas contorções
de suas entranhas
sem alimento.
As mesmas chagas
de seu corpo maltratado.
As mesmas lágrimas
o mesmo sofrimento
a mesma angústia
do não compreender.
Hoje
quero ser um homem do povo.
Viver por um dia
as estatísticas
dos levantamentos do Partido.
Fugir por um momento
ao jargão, ao palavreado
e chegar ao real.
Quero uma mente rústica
que até mesmo creia em Deus
e outras divindades.
Quero um corpo dorido
e um olhar sem luz
perdido languidamente
no incompreensível.
Quero vender meus braços
sufocar minha voz
amordaçar-me
crucificar-me todos os dias.
Hoje
serei um homem do povo
porque necessito
mais do que os dados minuciosos
mais do que a ciência.
Busco o sofrimento
naquele que sofre
para amá-lo
acima dos pronunciamentos políticos
para que nasça em meu peito
o ódio incontrolável
que dê força às minhas mãos
e torne certeiros os meus golpes!
Procuro o homem do povo
porque recuso
a mistificação revolucionária
dos gabinetes.
Porque necessito
paixão em minha luta
entusiasmo em minha voz
firmeza em meus passos
amor ao meu povo
e fé na sua vitória.