POEMA PARA PEDRO TEIXEIRA
ASSASSINADO
1
Ontem, senzala.
Hoje, cortiço.
Ontem, chibata.
Hoje, fuzil.
Ontem, Quilombos.
Hoje, Sapé.
O latifúndio, companheiro,
rói seu osso de Caim.
Coronel
fuzil
e olho
polícia
pau
e ferrolho.
O latifúndio, companheiro,
mói as fezes de seu fim.
2
Do homem é a terra
a terra e seus desertos
e sobre o campo se estende
o corpo do homem
— e a fome.
Cavei
colhi
perdi
Marido
campos
e filhos
pés de estrume
mãos de esterco
somos todos, companheiros,
húmus e homens, amém.
3
Cantou o galo uma vez
e Pedro foi de emboscada.
Se escurecia
noite adentro
sobre seu corpo
jorrando sangue.
Cantou o galo outra vez
e o filho sangrou-se à bala.
Menino-ovelha
adubo verde,
sangue fresco
em plantação.
Ronda o galo a casa aberta
de Pedro Teixeira morto.
Uma viúva e seus filhos
se espreitam na madrugada
que amanhece em sangue e brasa.
4
Vai a noite
alta é
uma viúva em seu leito
arde desejos de sangue.
— Mulher, por que morreu teu marido
com o corpo ferido?
— Moço, morreu ferido pelo inimigo
porque sabia do seu caminho.
— Mulher, por que feriram teu filho
na estrada de teu marido?
— Moço, feriram o menino
porque seguia o caminho
que vamos todos seguindo.
Desce o dia
longo é.
Uma viúva
ouvindo a voz do marido:
"Vai mulher
que a luta é"
desperta seus companheiros
e sai com a alba pelos campos.
5
Tu és pedra
Pedro Teixeira
e sobre ti levanto
esta bandeira.
Tu és brasa
Pedro Teixeira
e sobre ti já queima
esta fogueira.
Tu és guerra
Pedro Teixeira
e sobre ti cavamos
a trincheira.
Comentário do pesquisador
João Pedro Teixeira foi fundador da Liga de Sapé (PB) e morto em 1962 a mando de latifundiários. É tema do documentário de Eduardo Coutinho, "Cabra marcado para morrer". No dia 2 de abril de 1962, Pedro Teixeira foi morto por cinco balas de fuzil por pistoleiros da região. Naquela época, já um grande líder local, João Pedro enfrentava um conflito a respeito dos processos legais em torno do sítio Antas do Sono. O crime, executado pelo cabo Antônio Alexandre Silva, pelo soldado Francisco Pedro de Silva e pelo vaqueiro Arnaud Nunes Bezerra, teve evidente motivação política, com o objetivo de desmobilizar as lideranças camponesas da região. O sepultamento reuniu cerca de 5 mil camponeses que tomaram as ruas de Sapé. Em 1º de maio, semanas após a sua morte, um ato organizado pelos trabalhadores reuniu cerca de 40 mil pessoas na capital do Estado. Pressões para a instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito que elucidasse o caso de forma mais efetiva foram articuladas na Assembleia Legislativa do Estado. Após instauração da Comissão, foram identificados os mandantes do crime (Aguinaldo Veloso Borges, Pedro Ramos Coutinho e Antônio José Tavares), todos condenados, com exceção de Aguinaldo Veloso Borges, sexto suplente de deputado estadual, que assumira o cargo às pressas para garantir imunidade parlamentar. Os condenados foram absolvidos em março de 1965, pelo regime militar. Em 15 de julho de 2013, a Comissão Nacional da Verdade da Paraíba realizou uma audiência pública no município de Sapé para ouvir depoimentos a respeito das perseguições às Ligas Camponesas. Conclusão da Comissão Nacional da Verdade: Pedro Teixeira foi morto por pistoleiros contratados por latifundiários em ação que contou com a conivência e omissão do Estado brasileiro, em contexto de sistemáticas violações de direitos humanos contra os trabalhadores rurais e as Ligas Camponesas promovidas pela ditadura militar. Fonte: https://memoriasdaditadura.org.br/memorial/joao-pedro-teixeira/