Pobre república pobre

José Carlos Capinan

Pobre república pobre

 

 

I

É um dia de república

                   pobre pobre 

república azul

Como o primeiro dia do descobrimento

Plumas de arara

                jurunas

  o mesmo cruzeiro do sul

 

  É um dia de república

Como um dia de Tomás Antonio Gonzaga

  um dia de forca

  mais que um dia mineiro

um dia de Alferes e não Silvérios brasileiros.

 

 

II

  É um dia negro

Como teu dia Zumbi dos Palmares

  É um dia vermelho

Teu dia, Marighella e companheiros

  Novamente azul

Como o perverso dia dos mangues

  e canaviais

  Um dia em transe

Como os dias de Antonio Conselheiro

  Como os dias do teu novo cinema

  Amado Glauber

 

 

III

   Águas de março e abril

Águas do desabrigo, lavai o nosso desamparo

 

  Um dia do Fico, o dia em que partes

Desamado dia da pátria mais desamada

  Salve, salve

 

 

IV

  Sem dente de ouro e sem ouro

Hoje é o dia de Tiradentes

  não é o dia dos traidores

  Dia dos enforcados

Nem ladrões públicos

                 privados

  nem vômitos da mordomia

  nem doleiros

                muambeiros

nem dia dos dez por cento

                  é dia da agonia

                  é dia do sofrimento

 

V

   Cem milhões de atos

   litúrgicos cirúrgicos

   rasgam o teu ventre

 

   Estão abrindo o futuro

   no corpo do presidente

 

 

VI

Estão limpando o planalto

Estão lavando a planície

As bactérias resistem

Diz o noticiário

 

Velam templos e terreiros

Tanto pus nos impuseram

Entre a vida e a outra vida

já são mais de Sete Quedas

 

Já são mais de trinta dias

Adeus, adeus, Sobradinho

Acabou-se o sofrimento

Acabou-se o coitadinho.

 

(Que se acabem as prisões

Serras peladas

               filas de Inamps

secas

   inundações)

 

VII

É dia das elegias

dia de fazer repente

Diz o povo em sete sílabas

Não morreu o presidente

 

Cem milhões de bisturis

Estão limpando o teu ventre

Velha e suja república

Não morreu o presidente

 

                         Vivendo a tua morte

                         Estamos vivos novamente

                         É a ressurreição da pátria

                         Não morreu o presidente

 

Te vejo nas avenidas

E tão apaixonadamente

Sarando num bloco sujo

Não morreu o presidente.

 

O dragão ficou ferido

Vomita o sangue da gente

É pus da velha república

Não morreu o presidente.

 

VIII

   Amado filho de S. João Del Rey

Não somos filhos do ventre sujo

  e doente

  Somos filhos de tua guerra

  Contra esta república velha

que combates dentro do teu próprio

  limpo ventre.

 

IX

  Asas azuis

  Garras azuis, não

  Jardins de flores

  Jardins de maio, não

 

Abril já não é o mais cruel

— mês da ressurreição.

 

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— Colofão

Coordenação

Marcelo Ferraz (UFG/CNPq)

Nelson Martinelli Filho (IFES/UFES/CNPq)

Wilberth Salgueiro (UFES/CNPq)

Bolsistas de apoio técnico (FAPES)

Juliana Celestino

Valéria Goldner Anchesqui

Bolsistas de pós-doutorado (CNPq)

Camila Hespanhol Peruchi

Rafael Fava Belúzio

Pesquisadores/as vinculados/as

Abílio Pacheco de Souza (UNIFESSPA)

Ana Clara Magalhães (UnB)

Cleidson Frisso Braz (Doutorando UFES)

Cristiano Augusto da Silva (UESC)

Diana Junkes (UFSCar)

Fabíola Padilha (UFES)

Francielle Villaça (Mestranda UFES)

Henrique Marques Samyn (UERJ)

Marcelo Paiva de Souza (UFPR/CNPq)

Mariane Tavares (Pós-doutoranda UFES)

Patrícia Marcondes de Barros (UEL)

Susana Souto Silva (UFAL)

Weverson Dadalto (IFES)

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