PÃO, TERRA E LIBERDADE
Quero ao meu País
a esperança restaurada,
não a que se esvaiu pelos dedos,
a que se perdeu pelos esgotos,
a que foi anunciada pelos quartéis,
a que foi cantada pela propaganda,
mas a que continua germinando
na consciência do povo;
a que vem do processo
de acreditar na vida,
no direito de trabalhar,
de formar uma legião
em busca da cidadania
diante da aventura
da busca da Liberdade,
acabar com a fome,
aniquilar a miséria
e devolver o riso
aos lábios dos que choram.
Quero ao meu País
o direito à felicidade,
para que possamos dividir
alegrias,
sonhos,
desejos,
anseios,
construir um tempo novo
que vai alimentar os famintos
que peregrinam pelos arrabaldes
e que se multiplicam pelo mundo.
Quero que o meu País
respire o ar da independência,
não da independência vigiada,
sob a tutela do capital,
mas da independência sonhada
por todos os venturosos,
conduzida pelas mãos,
acalentada pelos velhos,
encorajada pelos jovens,
sem os grilhões da dominação
nos pés dos dominados
que peregrinam descalços
por todos os lados,
por todos os cantos,
por todos os caminhos
em busca do prometido.
Quero ao meu País
o destino da Liberdade,
não o destino imposto
por sanguinários com estrelas
no peito embandeirado
de vocação assassina.
Quero a esperança
de poder repartir
as riquezas com os que precisam,
dividir a vastidão
com os que peregrinam,
poder encontrar a todos
os que emprestaram os nomes
à Lista dos Desaparecidos,
poder confiar aos homens
a Justiça sem a desconfiança
de estar sendo enganado,
para que cada um possa
carregar a cidadania
e devolver à Pátria
toda a sua grandeza.
Não quero ao meu País
a dor de uma geração
que deixa o sangue nas salas
de tortura sem ser ouvida,
que se arrasta pelos corredores,
que respira gás lacrimogêneo,
que conversa com o próprio cadáver,
que tem medo de atravessar a rua,
que morre antes de nascer,
que não sabe se haverá amanhã,
que encontrou-se com a desgraça,
que escreve poemas
que nunca serão lidos.
Não quero ao meu País
a dor que carrego no peito,
o medo que carrego na alma,
a desesperança que vejo nos olhos,
o sentimento escondido no sótão,
a canção que escrevo nas trevas.
Quero ao meu País
pão,
terra
e Liberdade.
Rio de Janeiro, 1.12.71