OS PROFESSORES DE OSPB
Os professores de OSPB
invadem as salas de aula
com as lições de cinismo
diante dos olhos assustados,
que peregrinam pelos séculos
como quem desce uma escada
procurando o fundo do poço,
agarrando-se ao corrimão,
acreditando que o próximo degrau
seja o último.
Os professores de OSPB
trocaram as fardas
fantasiadas de estrelas
por pijamas de seda.
Lêem longas versões oficiais
de conquistas
e vitórias
dos vencedores transformados em heróis
contra os vencidos esquecidos pelo tempo.
Os homens montados em cavalos
transformam-se em estátuas
ou emprestam os nomes
para pontes,
praças,
viadutos
e avenidas
por onde caminharão os sem nome,
sem história
e sem existência.
Os professores de OSPB,
com os livros permitidos pelo regime,
“abrem” a cabeça dos meninos
para que guardem lembranças
dos atos de bravura
de um exército invencível
e as conquistas contra a fome.
Ninguém fala dos assassinados,
nem dos jogados ao mar
com as mãos atadas às costas
e uma pedra no pescoço,
nem dos que apodrecem nas prisões
sem direito de defesa,
sem acusação formal,
sem crime cometido,
sem julgamento,
sem culpa,
condenados da consciência.
Todos contritos na sala de aula
ouvem as lições compulsórias
semeadas sobre o inconsciente
como uma pá de cal,
e aprendem a conjugar o verbo amar
no tempo repressivo:
—— Ame-o ou deixe-o.
A Pátria possuída pela perplexidade
soluça em voz baixa
pela imposição de um amor
sem liberdade de escolha,
sem cumplicidade,
sem carinho,
sem ternura,
sem afeto,
sem amar.
Os meninos que ouvem a lição da caserna
ficam sem saber ao certo
quando dizem que amam
ou quando aprendem que amam...
Os professores, de olhos vigilantes,
espreitam os que insinuam
conjugar o verbo da vida
na forma da esperança:
—— Amai-vos uns aos outros...
Mas ninguém se atreve
a esta recordação de milênios
na classe contrita,
que não olha pela janela.
Os meninos levam para casa
as lições repetidas,
como um dever dos que soletram
sem saber ler
o que lhes ensinam nas escolas
e desenham sem saber escrever
o nome como se fossem cidadãos
em pleno exercício da Liberdade.
Os professores de OSPB
pegam na mão dos que não enxergam
e traçam sua sina
de cordeiros tosquiados,
que seguem em rebanhos passivos
se alimentando na pastaria
do imenso continente latino.
Os professores de OSPB
transformam as salas de aula
das escolas públicas da Pátria
em antros de cafetinagem,
onde todos aprendem em palavras
o verbo amar sem sentir prazer
e desenham no almaço
os destinos de marionetes.
Os professores de OSPB
invadem as escolas atônitas
com as aulas de ufanismo:
—— Coitados dos que conseguem aprender
estas lições do regime...
Rio de Janeiro, 12.5.72