Os professores de OSPB

Maciel de Aguiar

  OS PROFESSORES DE OSPB

 

Os professores de OSPB

invadem as salas de aula

com as lições de cinismo

diante dos olhos assustados,

que peregrinam pelos séculos

como quem desce uma escada

procurando o fundo do poço,

agarrando-se ao corrimão,

acreditando que o próximo degrau

seja o último.

Os professores de OSPB

trocaram as fardas

fantasiadas de estrelas

por pijamas de seda.

Lêem longas versões oficiais

de conquistas

e vitórias

dos vencedores transformados em heróis

contra os vencidos esquecidos pelo tempo.

Os homens montados em cavalos

transformam-se em estátuas

ou emprestam os nomes

para pontes,

praças,

viadutos

e avenidas

por onde caminharão os sem nome,

sem história

e sem existência.

Os professores de OSPB,

com os livros permitidos pelo regime,

“abrem” a cabeça dos meninos

para que guardem lembranças

dos atos de bravura

de um exército invencível

e as conquistas contra a fome.

Ninguém fala dos assassinados,

nem dos jogados ao mar

com as mãos atadas às costas

e uma pedra no pescoço,

nem dos que apodrecem nas prisões

sem direito de defesa,

sem acusação formal,

sem crime cometido,

sem julgamento,

sem culpa,

condenados da consciência.

Todos contritos na sala de aula

ouvem as lições compulsórias

semeadas sobre o inconsciente

como uma pá de cal,

e aprendem a conjugar o verbo amar

no tempo repressivo:

—— Ame-o ou deixe-o.

A Pátria possuída pela perplexidade

soluça em voz baixa

pela imposição de um amor

sem liberdade de escolha,

sem cumplicidade,

sem carinho,

sem ternura,

sem afeto,

sem amar.

Os meninos que ouvem a lição da caserna

ficam sem saber ao certo

quando dizem que amam

ou quando aprendem que amam...

Os professores, de olhos vigilantes,

espreitam os que insinuam

conjugar o verbo da vida

na forma da esperança:

—— Amai-vos uns aos outros...

Mas ninguém se atreve

a esta recordação de milênios

na classe contrita,

que não olha pela janela.

Os meninos levam para casa

as lições repetidas,

como um dever dos que soletram

sem saber ler

o que lhes ensinam nas escolas

e desenham sem saber escrever

o nome como se fossem cidadãos

em pleno exercício da Liberdade.

Os professores de OSPB

pegam na mão dos que não enxergam

e traçam sua sina

de cordeiros tosquiados,

que seguem em rebanhos passivos

se alimentando na pastaria

do imenso continente latino.

Os professores de OSPB

transformam as salas de aula

das escolas públicas da Pátria

em antros de cafetinagem,

onde todos aprendem em palavras

o verbo amar sem sentir prazer

e desenham no almaço

os destinos de marionetes.

Os professores de OSPB

invadem as escolas atônitas

com as aulas de ufanismo:

—— Coitados dos que conseguem aprender

   estas lições do regime...

 

 

  Rio de Janeiro, 12.5.72

 

 

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