OFICINA
"Hay que endurecerse, pero sin perder la
ternura jamás".
Ao companheiro Luiz José da Cunha, assassi-
nado em julho de 1973
Há nesta cidade uma oficina.
Há nesta noite uma oficina.
Os ferreiros são apenas sombras,
na hora tardia dos encontros.
Reter a palavra quando o gesto é possível.
Descer a rua como a bruma sobre o mar.
O vigia não perceba mais que o vento,
um sereno mais intenso.
Há neste país uma oficina.
Há uma oficina na América.
Percebemos daqui o martelar das ordens:
recortar no aço o rosto dos ferreiros,
a mão taciturna dos ferreiros.
Trabalhar no ferro a vontade
dos escolhidos, a alma retificada
na dor, a crença que resistiu purificada.
Há na madrugada uma oficina.
Há no sangue do povo uma oficina
de reservas infinitas,
que se reconstrói a cada minuto.
Você, companheiro, encontre os homens
que labutam na forja
e diz a eles por mim:
não malhem na bigorna sem ternura.
(73)
Comentário do pesquisador
Pedro Tierra é pseudônimo de Hamilton Pereira da Silva. O poema "Oficina" integra a seção homônima ao volume: “Poemas do povo da noite”. Na segunda edição desse livro (coeditada pela Fundação Perseu Abramo e pela Publisher Brasil, em 2009), há um texto introdutório intitulado “Explicação necessária”. Nessa introdução, Pedro Tierra (Hamilton Pereira da Silva) informa: “Os poemas aqui reunidos foram escritos durante os cinco anos de prisão – de 1972 a 1977 – e publicados em volumes separados: Poemas do povo da noite (Ed. Livramento, S. Paulo, 1979), Água de Rebelião (Ed. Vozes, Petrópolis, 1983)” (2009, p. 19). A edição de 2009, que reproduz “Oficina” na página 55, informa que esse poema foi escrito em 1973.