O VELHO
Ao Comandante Toledo, assassinado a 23 de
outubro de 1970
Contemplei aquela cinza
batida de vento,
que restara do massacre,
e, naquele momento,
fui apenas barro,
sem esperança de luz.
E ele veio, talvez
da própria cinza,
do fim da minha tristeza,
ele veio sem pressa,
veio antigo,
como o vento.
Descansou no meu ombro
a mão pesada,
não disse palavra,
mas trouxe nos olhos
um amor enérgico,
duro amor de homens livres.
Amor que aprendeu a
ser inteiro, contido,
como um punhal.
Busquei guardar
no peito
a força desse cristal,
a fonte desse amor que fere,
exige vontade,
transforma.
Retomamos na tarde
a memória dos mortos,
sem tristeza.
Retomamos na tarde
a estrada do povo,
sem trânsito.
A nos unir agora
o gesto do fogo
e o hábito de resistir.
(73)
Comentário do pesquisador
Pedro Tierra é pseudônimo de Hamilton Pereira da Silva. O poema "O velho" integra a seção homônima ao volume: “Poemas do povo da noite”. Na segunda edição desse livro (coeditada pela Fundação Perseu Abramo e pela Publisher Brasil, em 2009), há um texto introdutório intitulado “Explicação necessária”. Nessa introdução, Pedro Tierra (Hamilton Pereira da Silva) informa: “Os poemas aqui reunidos foram escritos durante os cinco anos de prisão – de 1972 a 1977 – e publicados em volumes separados: Poemas do povo da noite (Ed. Livramento, S. Paulo, 1979), Água de Rebelião (Ed. Vozes, Petrópolis, 1983)” (2009, p. 19). A edição de 2009, que reproduz “O velho” nas páginas 53-54, informa que esse poema foi escrito em 1973.