O globo
Como os reis tiveram o orbe no alto do cetro,
nós, crianças, tivemos o globo terrestre em nossa breve mão.
Eram azuis, os mares; coloridos, os continentes;
tantas linhas de alto a baixo, de Leste a Oeste
que podíamos localizar a nossa vaga pessoa
naquela vastidão.
Mas os reis pretenderam estar em todos os pontos
ao mesmo tempo.
E foram atravessados pelas batalhas, e agora
só nos jazigos seus nomes se encontrarão.
As crianças, porém, não queriam estar em parte alguma:
pulavam meridianos e paralelos com muita leveza.
Continuam não estando em parte alguma.
Mas com alegria maior que a da realeza:
a da libertação.
Comentário do pesquisador
No poema com data de 1964, Cecília Meireles conclui o texto fazendo um elogio à libertação. Considerando que o Brasil, justamente a partir do Golpe de 1964, estava sob um regime não democrático, a ideia de liberdade dialoga com o desejo de se ver livre dos Anos de Chumbo.