Nova canção do exílio

Luis Fernando Verissimo

Nova canção

do exílio

 

 

 

 

 

 

 

Minha terra tem Palmeiras
Coríntians, Inter e Fla,
mas pelo que se viu na Argentina
não jogam mais futebol por lá.

 

Os amigos que aqui gorjeiam
dizem que a coisa vai aos trancos.
Falam de promessas de abertura
e de um suposto novo Santos.

 

Nosso céu tem mais estrelas,
mas no chão continua o assombro:
a melhor conjunção do horóscopo
é a de quatro estrelas no ombro.

 

Nossas várzeas têm mais flores
nossas flores mais pesticidas.
Só se banham em nossos rios
desinformados e suicidas.

 

Nossos bosques têm mais vida
porque nas cidades se morre.
Quando não é assaltante ou vizinho
é um motorista de porre.

 

Em cismar, sozinho, à noite
mais prazer encontrava eu lá.
Agora sei que cismar pode,
mas sozinho, e à noite, não dá!

 

Minha terra tem palmeiras
mas anda escasso o arvoredo.
Tudo se corta, queima e derruba
menos, claro, o Figueiredo.

 

Minha terra tem primores
de que os amigos me falam até tarde.
Lembro samba, feijoada, bons papos,
mas quem é essa Bruna Lombardi?

 

Nossos bancos têm mais juros
nossos corruptos mais favores
nossos pobres mais desgraça
nossa vida mais amores.

 

O sabiá, eu sei, já não canta
por questões ecolo-genéticas.
Mas ninguém sentiu muita falta,
agora existem as Frenéticas.

 

Descobriram um sabiá renitente
que insistia em cantar, por mania.
Seu número não passou na Censura:
ele insistia em cantar “Anistia!”.

 

Leio Veja, IstoÉ, JB,
mas o pacote chega atrasado.
Estou atualizadíssimo
com o Brasil do mês passado.

 

Minha terra tem novidades
que compreendo mal e mal.
Mandei perguntar: “E o biorritmo?”
Responderam: “É lento e gradual.”

 

Às vezes nos reunimos
para grandes sessões nostalgia.
Um disco do Chico, um retrato
ou uma leva de ambrosia.

 

Minha terra tem sabores
que tais não encontro eu cá.
Todos os vinhos do exílio
por um gole de guaraná!

 

Há coisas que não acredito
entre o trágico e o cômico.
Peste suína, carnaval subvencionado
vá lá — mas o senador biônico…

 

Minha terra tem palmeiras
onde cantava o sabiá.
Grande questão só há uma:
a Júlia fica com o Cacá?

 

Mas não permita Deus que eu morra
sem que eu volte para lá.

 

 

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Bolsistas de pós-doutorado (CNPq)

Camila Hespanhol Peruchi

Rafael Fava Belúzio

Pesquisadores/as vinculados/as

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Ana Clara Magalhães (UnB)

Cleidson Frisso Braz (Doutorando UFES)

Cristiano Augusto da Silva (UESC)

Diana Junkes (UFSCar)

Fabíola Padilha (UFES)

Francielle Villaça (Mestranda UFES)

Henrique Marques Samyn (UERJ)

Marcelo Paiva de Souza (UFPR/CNPq)

Mariane Tavares (Pós-doutoranda UFES)

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Susana Souto Silva (UFAL)

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