MATEMOS A ROSA
A Eliézer Demenezes
A gripe me separa de minha família.
Casado — provisòriamente no regime de separação de corpos,
pai — provisòriamente frustrado, desterrado para o outro
extremo da casa,
durmo na sala, de quarentena.
Mas não durmo: penso no porvir de meus filhos.
Não o desejarei de rosas.
Não porque pense nos espinhos.
— o Homem forja-se na luta
e muita vez os espinhos valem mais do que as rosas.
Mas porque as rosas têm hoje outra carga simbólica
e já nada diferem dos cogumelos.
Pais de todo o mundo, cuidado! aos nosso filhos
não lhes demos a cheirar destas rosas,
a comer dêstes cogumelos.
Sei que o meu apêlo é patético,
sei que somos doidos brincando no jardim,
e talvez eu mesmo ajudasse a plantar a rosa,
a dar sombra e umidade ao cogumelo.
Mas os meus filhos estão chorando
e agarram a vida com ambas as mãos no seio materno.
Quisera lhes dar a justiça que não temos construído,
o amor que não temos regado.
Fujamos para o quintal!
fujamos para os vastos abandonados quintais
de nascituras hortas, pomares e roçados.
A rosa corre de mão em mão
— quem quer a rosa?
— quem não quer a rosa?
— quem a despetala?
— quem lhe aduba a terra?
Fujamos para o quintal
e esqueçamo-la,
entre abóboras, repolhos e pepinos,
esqueçamo-la,
sob os pimentões e o trigo
sepultemo-la com sua morte.
As batatas e as cebolas manam a poesia.