IV — RIMANCE DOS INOCENTES
Sob as patas inocentes
dos inocentes cavalos
as inocentes crianças.
Impossível condená-lo,
este quadro de inocências:
inocentes os cavalos
— que não sabem o que fazem;
inocentes as crianças
— que não sabem de pecado.
E os cavaleiros fardados
que acicatam os cavalos?
Inocentes cavaleiros
feitos de argila de charco?
inocentes alimárias
que nunca viram do claro?
Tão puros como as crianças?
tão puros como os cavalos?
Tão puros como uma pedra
que alguém atira nos ares.
Pobres bonecos fardados,
bonecos de lama e lodo,
que um deus criou por guardá-lo
nos seus palácios de engodo.
Pobres bonecos que matam
enquanto se treme todo
seu colérico-medroso
bispo da igreja da Ordem.
Pobres bichos inocentes
a quem tirou-se a inocência!
pobres bichos cibernéticos!
pobres bonecos que agora
sangram lírios e não sabem
que são lírios as crianças
e lírios há nos cavalos!
Mas as crianças entraram
no Templo, e também já entram,
para a comunhão de sangue,
cavaleiros com os cavalos.
Oh! o espanto das crianças!
(Espanto nos cavaleiros?)
Oh! o espanto dos cavalos!
Espanto até nas calçadas!
Nas pedras, nos azulejos,
no asfalto, o espanto abrasava!
Deste espanto, deste sangue,
desta inocência pisada
brota um áspero perfume
como de flor machucada.
Odor de sombra, que envolve
a rua, a cidade, o mundo,
que de brancuras violadas
dá conta aos guardados deuses.
Mas — ai, que, pedras, não sentem!
Ai, corações que não se abrem!
Deste eSpantO, deSte sangue
cifra-se, invisa, a mensagem.