Ibiúna sitiada

Maciel de Aguiar

          IBIÚNA SITIADA

 


Soldados com metralhadoras 

cercam as escolas da pátria, 

os meninos com livros em punho 

enfrentam as balas assassinas 

feito escudos de papelão, 

em declaração de guerra
contra a vida infante, 

sitiando a Liberdade.
Pelos Campus os soldados 

apagam o saber com os coturnos, 

marchando sobre a esperança 

plantada em cada coração 

que traz em taquicardia 

o medo do obscuro em cada batida, 

cada pancada.
— Vamos todos para o mato 

  aprender com os bichos 

  o saber dos homens… 

Em sigilo inconfidente, 

os estudantes de hoje 

caminham pela noite, 

cada um com seu caderno 

de sonho
e pesadelo,
cada um com uma pedra
escondida entre os dedos,
cada qual com o pressentimento
entremeado na alma,
em cada passo uma aventura, 

os estudantes caminham
neste tempo de revolta. 

Muitos vindos do sul,
outros surgindo do leste, 

do norte em ebulição 

e dos pantanais de mistério 

ao encontro clandestino, 

hora e dia marcados 

na memória
e na coragem
de uma gente destemida. 

Todos caminham contritos 

para aprender a lição 

da vida que nos instiga 

a procurar a Liberdade. 

Cada menino aprendiz 

anota na alma
o que jamais será esquecido. 

— Todos no lugar, todos,
  e se o mestre mandar fazer.

  faremos todos.
  e se não fizermos
  seremos presos...
Os meninos cantam pelos caminhos
dos bandeirantes de ontem
as canções de nosso tempo:
protesto
e alegria.
Mas os soldados com metralhadoras
cercam as estradas do Vale
do Ribeira com baionetas, 

montam barricadas,
desmancham desejos 

e revivem pesadelos. 

— Ibiúna sitiada,
  Ibiúna pisoteada,
  Ibiúna prisioneira,
  Ibiúna campo de guerra,
  Ibiúna que não será esquecida…,
escrevem na memória
esvaída pelos esconsos,
tomados pela surpresa
e pela amargura...
Todos a postos nos caminhões,
viagem de volta do sonho,

trazendo na palma da mão 

o rascunho dos discursos 

e nos corações venturosos

uma pergunta uníssona:
Será que continuaremos presos? 

— Será que continuaremos vivos? 

— Será que seremos mortos? 

Os soldados com suas armas 

sitiaram o Sítio
e fizeram de Ibiúna
para sempre uma lembrança 

empedernida no caminho
dos que aprenderam com a derrota 

a lição da Liberdade.
Ibiúna viverá,
perante a História.
como um Campus impossível 

de uma batalha inglória.
Ibiúna viverá em nós
eternamente sitiada.

 

 

                     São Mateus-ES, 28.11.68

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