Flasches

José Emilson Ribeiro da Silva

 FLASCHES

 

Gritos ecoaram em celas, vazias

de fraternidade e sentimento nobre

ossos partidos na sede de segredos

queimada pele na eletrização constante,

dilaceraram carnes, deceparam órgãos

de homens decididos, valorosos

porque a si nada buscavam.

 

Não há dor maior que da autoconfiança perdida

nem tristeza tão profunda que de compromisso rompido

e maior que a maior das traições amorosas

é a confissão arrancada da “medição” de forças

na forma covarde aos indefesos.

Que se mate, que se sangre, que se fuzile

no fragor da luta, no sangue fervente, mas

nunca na frieza calculista ao maior suplício.

 

Não são homens estes carrascos

mas, animais envilecidos

no sadismo, frieza e ferocidade.

Pagar onde irão estes deformados

se céu não exista à recompensa

inferno é o que aqui vemos e

entre diabos ainda impunes

que mulheres alheias estupraram

filhas doutrem iniciaram

seviciando-as aos gozos e risos

sob gritos, insensíveis, de vergonha e dor.

E o sexo primeiro que com amor feito

gozos e alegrias, é jamais esquecido

jaz dessa forma pelo ultraje

para sempre no fundo dalma

com asco lembrado, trazendo

à boca o sabor amargo do sangue.

 

Homens e mulheres de brancos ideais

(vermelhos alcunhados pelo sangue

secular do antagonismo classista)

ousar enfrentaram a sanha do inimigo

de ferocidade porque frágeis seus fulcros

garroteando forças a reprimir oponentes

se envileceram, se animalizaram:

uns, no ordenar atrocidades

outros, na execução consciente.

 

Assim como a ave de rapina

a presa não solta, senão ferida,

homens e mulheres de ideais brancos

porque de justiça ampla exigida

aos poderosos ousaram ferir

com incipientes armas e artilheiros

e milhares de manos tombaram

por este Brasil em fora;

mais sob armas brancas e frias

que de fogo fuzilados.

Foram cordas, arames,

e fios a enforcamentos,

água afogando corpos inertes,

choques elétricos de efeitos vários

sobre seios, pênis, retos e clitóris,

fornos como os usou Hitler

e animais como nos circos de Nero.

Mas foi válida a tentativa

apesar das baixas valorosas,

(momentaneamente irreparáveis)

alguém teria de começas um dia,

e o aprendizado se fez...

e fomos nós a geração sacrificada

ao plantio de sementes ardentes

sanguinolentas sementes irreversíveis.

 

E os lamentos dolorosos

da mãe, do pai, do irmão

e dos filhos órfãos

da noiva e mulher viúvas

dos companheiros fraternos

na impotência à vingança

não serão perdidos no espaço

como vozes tresloucadas

mas lembrados nas canções do povo

que seus heróis jamais esquece.

Corram águas, corram os ventos

diminuam-se as lutas

em formas outras substituídas

não levarão nem olvidarão

o sangue dos abnegados

que nada tinham e tudo queriam dar

com ardor e intenções denodados.

Denodo e abnegação alfim devolvidos

serão, em gratidão aos tombados

na justiça ao povo distribuída

porque pelo povo conquistada.

 

E que importa que exista eu que existas tu,

nossos filhos e netos e os dos tombados

a sentirem no arrepio da pele o fervor do sangue

nas emoções desta justiça proclamada...

o que importa são os pulos de cada povo

nos passos eternos da humanidade.

 

   Itamaracárcere, 10/07/78.

   Emil

 

 

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