No caso de Paulo Leminski – e talvez de grande parte dos autores – a noção de primeira publicação é muito difusa, espécie de miragem buscada por críticos que podem chegar a conferir em autópsias, nas cavernas do cérebro de um autor, a primeira edição de um verso vadio. Diz a lenda – talvez seja falsa, provavelmente inventada em uma página da internet escrita por Renatus Cartesius – que a primeira versão desse poema foi criada em um guardanapo de boteco, folha que antes havia servido de canudo para uma narina. O poema foi escrito quando Leminski não tinha dinheiro para pagar a conta e anotou o texto e saiu correndo. "Do guardanapo original, ninguém nunca vai saber quanto custa uma saudade", declarou, certa vez, a narina.
Comentário do pesquisador
Traçando um entre-lugar, dividido entre a "dívida externa" (algo em que a Ditadura Militar efetivamente se aplicou em desenvolver) e a dúvida interna (suas questões mais íntimas), está o coração comercial (e portanto não apenas de esquerda, mas havendo, no poeta publicitário, uma visão de mundo também liberal). O eu poético alterna, oscila. O desenho gráfico do texto também oscila entre um alinhamento à esquerda, nos quatro primeiros versos, e um mais liberal, no último verso. Ademais, o texto realiza uma paródia intratextual, gerando humor: a dívida externa é relida como dúvida interna, termos de proximidade sonora e significados paradoxais.