para ter meus chinelos, meu vestido, meu perfume, meu casaco
dependo dee meu crédito, de minha ficha no fichário.
para ter meu emprêgo, meu salário, minhas férias, meu abono
dependo de meu horário, de meu terno, de minha gravata
e do ponto de meu ônibus.
para ter minha morada, minha casa, minha cama e meu quarto
dependo de minha firma no cartório e de meu contrato.
para ter meu automóvel, minha tevê, meu sofá, minha poltrona
dependo de meu débito, do saldo de minha poupança.
para ter minha comida, o meu prato, a minha louça, a água
de meu copo
dependo de minha renda, do depósito de meu imposto.
para ter ter minha cadeira, minha panela, meu pijama, meu capacho
dependo de meu empréstimo, do registro do meu nome no cadastro.
para ter meu espelho, meu batom, minha tesoura, minha peruca
dependo de minha moda, de meu receio, de minha censura.
para ter o meu passeio, a minha viagem, o meu domingo
na avenida
dependo de minha carteira, de minha bagagem, de minha licença
na curva de cada esquina.
para ter minha escola, o meu livro, o meu lápis, a minha vaga
dependo do desconto do meu juro, do preço de minha taxa.
para ter minha escolha, minha vontade, minha raiva, meu consolo
dependo de meu costume, de minha lei, de meu remorso.
para ter minha palavra, meu discurso, meu juizo, meu governo
dependo do estado de meu regime, da omissão do meu desejo.
para ter meus amigos, minha paixão, minha mulher, meu sexo,
a minha festa
dependo de meu tabu, de minha recusa no disfarce de minha
entrega.
para ter minhas idéias, meu direito, a força de minha luta
dependo de minha fraqueza, de minha fuga, do teu mando
que me anula.
dependo do fichário
do ponto de meu ônibus
do contrato.
dependo da poupança
do meu imposto
de minha taxa
do nome no cadastro.
dependo de cada esquina
do meu remorso
de cada ficha
deste decreto
de minha censura
do teu vulto
que se avulta.