COM ESTAS MÃOS
Ao companheiro Jonas, torturado até à morte
em 29 de setembro de 1969
Cultivarei o chão da manhã.
Com estas mãos
ainda algemadas.
Não importa o sangue,
se ele brota dos meus dedos
ou da terra ferida.
Não importa se a colheita de luz tarda,
ou se os depósitos da noite permanecem intactos.
Não importa que a passagem do inimigo
só tenha deixado destroços.
Cultivarei o chão da manhã,
embora, hoje, eu deva recompor
o corpo de meu irmão feito em pedaços.
Não importa se tarda a colheita de luz.
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Comentário do pesquisador
Pedro Tierra é pseudônimo de Hamilton Pereira da Silva. O poema "Com estas mãos" integra a seção “A hora do inimigo”, parte do volume “Poemas do povo da noite”. Na segunda edição desse livro (coeditada pela Fundação Perseu Abramo e pela Publisher Brasil, em 2009), há um texto introdutório, intitulado “Explicação necessária”, em que Pedro Tierra (Hamilton Pereira da Silva) informa: “Os poemas aqui reunidos foram escritos durante os cinco anos de prisão – de 1972 a 1977 – e publicados em volumes separados: Poemas do povo da noite (Ed. Livramento, S. Paulo, 1979), Água de Rebelião (Ed. Vozes, Petrópolis, 1983)” (2009, p. 19). A edição de 2009, que reproduz “Com estas mãos” na página 67, informa que esse poema foi escrito em 1974.