CARTA A MEUS COMPANHEIROS EM GREVE
Iniciamos a marcha com as mãos vazias.
Partem sem armas, dirão.
A escuridão e a distância
não os terá permitido
perceber a reserva de força
no peito de cada um.
Hoje contamos apenas com dois olhos
para estabelecer o caminho.
E nos bastam.
Se o inimigo arrancar o direito,
o esquerdo se transformará em estrela.
E se vier a morte, será bem-vinda:
a morte traz, hoje, um gosto de vitória.
Há os retardatários, eu sei.
A própria noite os dissolverá.
Na última volta do caminho
havia um desvio à direita de quem marcha...
(25/26, out. 74)
Comentário do pesquisador
Pedro Tierra é pseudônimo de Hamilton Pereira da Silva. O poema "Carta a meus companheiros em greve" integra a seção “A hora do inimigo”, parte do volume “Poemas do povo da noite”. Na segunda edição desse livro (coeditada pela Fundação Perseu Abramo e pela Publisher Brasil, em 2009), há um texto introdutório, intitulado “Explicação necessária”, em que Pedro Tierra (Hamilton Pereira da Silva) informa: “Os poemas aqui reunidos foram escritos durante os cinco anos de prisão – de 1972 a 1977 – e publicados em volumes separados: Poemas do povo da noite (Ed. Livramento, S. Paulo, 1979), Água de Rebelião (Ed. Vozes, Petrópolis, 1983)” (2009, p. 19). A edição de 2009, que reproduz “Carta a meus companheiros em greve” na página 66, informa que esse poema foi escrito em 25/26 de outubro de 1974.