Sobre o balcão mais sordido da rua
põe o poeta a pastar sua Quimera,
que nos fascina e logo se insinua
em cada um — senhora, bela e fera.
É noite ainda, sim, mas outra, funda,
que essa magia urina em nossas veias:
grinalda misteriosa nos circunda
de perfumes, sussurros, suaves teias
de amavio...E bebemos, com o poeta,
amores idos já, tornados alma,
auréolas de silêncio, água quieta
embalando Memória, Tempo e Calma.
Bebemos com o poeta, que suscita
luas agônicas — e as dilui
em nossos copos. Negro vento agita
os escombros da noite: quem possui
a chave do Sossego? o segredo
das mãos pacificadas? a poção
do hálito feliz? quem tem o ledo
condão de aceitar seu coração?
Ninguém, ninguém! Só resta o viajar
para Profundo, e Alto, e Mais Além!
A um gesto do poeta, ergue-se o bar
e a vertigem da viagem rompe, vem
nos habitar. E eis que só ela é.
E é o Sonho, o Sonho! Já nos integramos
em seu ser. Uma estrela vem até
nossos olhos, e os beija. E sonhamos.
Este é o nosso País, a nossa Era
— muito acima da hora magra e agra —
que, soltando a pastar sua Quimera,
o anjo Anysius ilumina e sagra!