Cantor (A Geraldo Vandré)
No ponto de não-retorno,
de muito choque, muito coice, muito soco,
de tanto andar pela terra dos outros,
a loucura é um ponto morto,
o ópio do corpo amadurece
as verdes uvas dos olhos do moço.
Gerado no mar e nas águas do povo,
arauto alto,
a solidão é um ponto de não-retorno.
Caminhando e cantando a voz quebrou-se aos poucos,
desorientando-se em américas dos loucos,
comendo e bebendo da chuva e das flores,
vadeando os riachos,
abrindo os braços,
no violão, no frevo, na cantiga
ou no vai-lá-pra-baixo,
diz não ao rock
não ao choque
não ao golpe.
A solidão é um copo de mau rebordo.
Como cantou a missa em Saint-Germain,
como fumou e enevoou suas manhãs,
como povoou de sons o oco da maçã,
como tinha um suéter vermelho de lã,
está opaco, apático: apagou.
De tanto se queimar, se incinerou.
Agora vão tentar a interdição
por muito louco
muito moço
muito poço.
Proibido de ser. Como cantar então?
Do centro de seu corpo o poeta tira o canto.
A quem o gume do asco toca o centro
não resta nada mais: só o silêncio.