9. BREVIÁRIO DA PANTOMINA
Nesta época de economia
e de aflição, melhor fingir
de morto para os transeuntes,
porque no morto tudo sobra.
Deixá-los bater de repente
no meu corpo, como abalroam
casualmente na palmeira
em ruínas, e na verdade.
Autorizá-los a jogar
o dominó noturno, mesmo
sobre a memória do que foi
tão vivo no tablado negro.
E, se porventura, algum deles
desconfiar de minha morte,
eu tão somente deverei
pedir que não a considere.
Que só o morto-falso pode
fazer o sobrenatural:
a porta leve, a dobradiça
suave para os inocentes.