ASPIRAÇÃO
Não quero ser o poeta do nosso tempo
nem o poeta do tempo estrito da crítica
ou do tempo complacente de algum leitor
vago e simpático como as conveniências
de mandar e poder até não poder mais.
Quero ser o poeta obscuro do meu tempo,
mas poeta do meu tempo ou do mau tempo
nesta meia-água-furtada e sem escritura,
morada do meu ser e dos incríveis
fantasmas que desempenham apenas
as pontas dos papéis picados
caindo na avenida.
Não quero ser o poeta do tempo dos outros,
dos que não fazem nada e vivem cobrando
posições, pronunciamentos, entrevistas
e tantas outras afirmações de poder...
Quero é apanhar logo os meus óculos
e tomar posse das minhas sombras.
Ser ausente e devoluto
— uma terra sem dono
para ser repartida num domingo
de muito vento e chuva no planalto.
Comentário do pesquisador
Neste poema, Gilberto critica os poetas omissos, que não demonstram criticidade frente ao momento político ditatorial presenciado.