A morte do atleta
Como um fruto partido
soluça a mão do atleta.
Ainda quase um menino.
Podia ser um poeta.
O tiro que o matou
nasceu da madrugada
trazendo a doida face
da morte mascarada.
O tiro que o matou
foi tiro de assassino.
Era apenas um atleta
desarmado, um menino.
Não era rei, filósofo,
político ou profeta.
Tinha alma de menino
em seu corpo de atleta.
O tiro que o matou
era um tiro sem meta:
o ódio abriu-lhe no ar
uma estrada secreta.
E o grande corpo morto
santificou o chão.
Quem morre pelos outros
nunca morreu em vão.
Jamais a ideia limpa
e o jogo do destino
encobrirão de sonho
o tiro do assassino.
Quem mata um inocente
com riso de menino
não quer a liberdade:
tem alma de assassino,
qualquer que seja o credo,
a raça, a roupa, o hino,
quem mata um inocente,
um atleta, um menino.
Massacre de Munich, 1972
Comentário do pesquisador
Embora faça referência clara ao atentado terrorista que vitimou onze atletas israelenses durante as olimpíadas de Munique, ocorrido em 1972, é difícil não associar o poema ao período de maior tirocínio do regime militar brasileiro. A imagem do jovem assassinado pelas forças do ódio e a alusão às restrições de liberdade justificam uma leitura alegórica, capaz de driblar a censura e lançar luz sobre a brutal repressão no país.