A GUERRILHA ABAFADA
Para Amaranto Jorge Rodrigues.
A guerrilha que subiu a serra
foi encurralada antes do primeiro tiro,
pés descalços contra os coturnos,
corpos infantes contra os tanques,
esperança de Liberdade
contra as Ordens do Dia,
frente os meninos com as armas
de estilingues
e sonhos
para enfrentar o regime…
Corpos possuídos pela aventura
embrenharam-se nas matas
onde o Espírito Santo vira Gerais,
onde as minas de ouro velho
derramam o sangue dos inconfidentes
deste nosso tempo de hoje,
escorrendo pela História
que não aprenderemos nas escolas…
A guerrilha da passagem
para o sonho da vida
subiu,
subiu,
subiu
a serra intransponível,
em aventura de heróis
de revista em quadrinhos
e insurreição de coragem,
folhetim revirando as almas
enquanto os soldados apontavam
a vocação assassina
para o peito dos mortos.
A guerrilha subiu,
subiu,
subiu,
subiu
a serra tateando o caminho
em busca da partilha da luz,
enquanto os senhores do mundo
mandavam apagar as marcas
do itinerário da volta.
Ouvi a notícia lacônica
na voz do rádio defronte:
a serra desceu,
desceu,
desceu,
desceu
sobre os ombros dos derrotados,
e os pesadelos viraram trevas
na noite longa de agonia
anunciando a rendição.
Mães vão procurar os filhos,
noivas vão chorar os amados,
velhos vão recordar os netos,
meninos lembrarão dos pais,
mulheres vão se fechar em luto,
só de ouvir anunciar
a vitória do regime
sobre o sonho da Liberdade.
A guerrilha do Caparaó
só será guardada
na lembrança dos vencidos.
Rio de Janeiro, 2.10.71