A geração do medo

Lourdes Teodoro

A GERAÇÃO DO MEDO

 

 

Para além da cinta do horizonte

apertam-nos os punhos

e caladamente as nuvens se dissipam

cada vez mais longe

apertando-nos os punhos.

nossas cabeças esvaziadas

nas gerações que demos ao mundo,

ungidos todos pelo limo das prisões.

nossos frutos crescem sem sabor nem cheiro

e os acusamos de traírem a semente

mas eles, inocentes, nem sabem da traição.

são filhos da geração do medo

e já viram o sol quando era noite de dia.

mas de qualquer ordem lhes veio a coragem

de andar pelas ruas, vazias as mãos.

nossos filhos são frutos que não meditam

além da mesa onde o jantar acontece

quando não são apenas olhares de lagarto assustado

que ouve passos e se esconde no mato à espreita

do direito ao lixo.

são filhos da geração do medo

cujo grito calado bloqueou a artéria

e a descompressão foi feita

esvaziado o pensar.

 

querem flores e hinos no meu sangue

mas no meu sangue há apenas sangue

e medo de falar e medo de calar

    porque nossos filhos...

são nossos filhos

e precisamos que sejam filhos do seu tempo

esse tempo que construímos

com silêncio e morte.

sem horizontes, esse tempo é frio.

sem horizontes, esse tempo é feio

para nossos filhos.

 

plantar e arar a terra

é necessário agora

quando tudo se esqueceu para durar

como os carvalhos antigos

apenas dando sombra.

 

a geração do medo desfila e quer pensar

quer dizer, contar, lembrar.

só a história planta a consciência

no opaco momento.

bordadeira desesperada, a geração do medo

cata retalhos

tinge peças

e tenta construir

mostra sua face e distribui o antigo desabafo.

 

como ficou difícil ser,

mas foi sempre difícil ser em vão.

 

junho, 1978

 

 

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Ana Clara Magalhães (UnB)

Cleidson Frisso Braz (Doutorando UFES)

Cristiano Augusto da Silva (UESC)

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Fabíola Padilha (UFES)

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