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E agora, José? Se os militares deixam e guardam
a praça aberta ao povo e não são mais apenas
os capitães-de-mato dos donos da riqueza injusta?
Se estes se veem agora sem a festiva mascarada
dos biombos de leis e de decretos que escondiam
a sua específica face de opressores?
A hora é de saber a história, é de amá-la em seus desvios
e em seu longo e lento curso a alternar-se entre verões e invernos.
A hora é de olhar as raízes do homem em cada hora
—— a sua vegetal profundidade de milênios, a sua alma mineral entre as estrelas ——
e o seu transformar-se, degrau por degrau, na escadaria
dos tempos em que ele é o que não era, sempre se tornando em outro
libertado dele próprio, mistura de alegrias e tristezas, morte e vida.
Desejar não serve ao homem se a espessura do real não é
a sua história enquanto liberdade transformada em corpo. A hora
é de fazer o que nunca deixou de fazer quem é poeta:
ouvir em cada coisa o grito aprisionado
daquele que a fez sem ter sequer por paga
a sombra de um domingo que valesse a pena.
Este é o ofício da mão que escreve o tempo e as avenidas
sabendo-os como o rosto de deus a esfacelar-se
em explosões de amor e em liberdade infinda.
Comentário do pesquisador
O poema faz parte da seção intitulada "O texto".